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quarta-feira, 16 de março de 2011

A força (ou a fonte) que nunca seca


Assim que entrei no Twitter nesta quarta-feira, notei que o nome de Maria Bethânia estava nos Trending Topics (a tal lista que o twitter divulga com os conteúdos mais falados e repercutidos numa cidade, país ou no mundo). Pois bem, o nome da baiana estava lá, no topo dos assuntos mais comentados, pelo Twitter, no Brasil. Quando cliquei no link referente à ‘diva’ Bethânia, fui redirecionado quase que imediatamente à seguinte matéria publicada nesta quarta, às 09:01h, no site do jornal Folha de São Paulo:

“A cantora Maria Bethânia conseguiu autorização do Ministério da Cultura para captar R$ 1,3 milhão e criar um blog”

Obviamente, o título da matéria é chocante. E o conteúdo, mesmo que minúsculo, também. A informação da Folha foi dada pela colunista Mônica Bergamo, e repercutiu não só pelas redes sociais, mas também por outros veículos jornalísticos espalhados pela web. Não demorou muito para que surgissem diversas críticas avassaladoras em torno da cantora, além de alguns outros protestos virtuais voltados ao Ministério da Cultura (MinC). Esclareçamos, então, os posicionamentos dos dois lados da moeda: povo brasileiro e artista que almeja incentivo.
De fato, o título da matéria da Folha (“Maria Bethânia terá R$ 1,3 milhão para criar blog”) foi um tanto quanto sensacionalista. E, segundo a assessoria da cantora – em resposta ao portal R7.com – até mentiroso: “O pedido ainda não foi aprovado pelo Minc. O projeto ainda precisará de um patrocínio para ser levado em frente”. Mas, antes do fato já ter sido ou não concretizado, analisemo-no antes. A ideia de Bethânia é de que o site “O Mundo Precisa de Poesia” ofereça ao público 365 vídeos da cantora interpretando grandes obras poéticas, sob a tutela do diretor e produtor Andrucha Waddington – esposo da atriz Fernanda Torres e um dos sócios da produtora Consipiração Filmes. O projeto, segundo a assessoria de Bethânia, está sendo avaliado para que entre na Lei Rouanet.
Mas vamos ao que de fato importa e nos interessa: quanto custa a criação e manutenção de um site? Segundo a tabela de preços da Associação Paulista das Agências Digitais (Apadi), a estrutura básica – incluindo planejamento, arquitetura, criação, implementação e conteúdo institucional enviado pela cliente – está orçada em 20 mil reais (replicando para outros idiomas, o custo subiria entre 30 e 50% do valor inicial do site). Além disso, a Apadi estabelece que a inclusão de ferramentas interativas deve ser cotada à parte. A ideia de “O Mundo Precisa de Poesia” é que o site seja atualizado diariamente. Para isso, seria necessária uma equipe técnica, diversos profissionais envolvidos, figurinista, maquiadores, instrumentos de filmagem e edição, além (é claro) dos honorários do Andrucha. Que, imagino eu, não devem ser nada baratos.
A questão é que, para que esse projeto seja realizado, o Ministério da Cultura aprovou (ou aprovará) a captação de R$ 1,3 milhão. O valor é astronômico, e não precisa ser nenhum gênio para ter consciência de que, para a criação, manutenção e divulgação desse projeto (pessoal) mais de um milhão de reais não seria necessário. O motivo de revolta de muitos twitteiros – que pesquisaram ou não sobre o assunto – é de que “O Mundo Precisa de Poesia” seria viabilizado por meio de dinheiro público. O fato de o MinC autorizar a captação de recursos  significa que a cantora está autoriza a colher e buscar recursos  junto às pessoas físicas e ou jurídicas – ou seja, patrocínio privado. Contudo, se empresas ou indivíduos patrocinam um projeto cuja captação de recursos foi autorizado pelo MinC, significa dizer que esses doadores receberam algum tipo de incentivo fiscal com base no valor doado.
De forma prática, significa dizer que o dinheiro não ‘sai’ diretamente dos cofres públicos, mas ‘deixa de entrar’ por meio de impostos. No caso do cinema, há o fato de que o financiamento gera um retorno indiscutível aos cofres do Ministério da Cultura – e, no caso de um blog/site, esse retorno não parece alcançar o mesmo custo benefício proporcionado pela sétima arte. E, venhamos e convenhamos, R$ 1,3 milhão podia ser utilizado para uma gama muito maior de serviços, não apenas para mostrar via internet que o mundo precisa de poesia. E, claro, fica a dica: www.viniciusdemoraes.com.br e www.claricelispector.com.br.

Obs.: “Há três anos, Bethânia se envolveu numa polêmica ao ter um pedido de captação, de R$ 1,8 milhão para uma turnê, rejeitado pela área técnica do ministério. O então titular da pasta, Juca Ferreira, ignorou o parecer e autorizou a captação de R$ 1,5 milhão” [trecho da matéria da Folha]. Por motivo de informação, a titular da vez é Anna Maria Buarque de Hollanda, irmã de Chico Buarque.

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