SÃO PAULO - No primeiro semestre de 2011 a Previdência concedeu 109 mil auxílios-doença a trabalhadores que sofreram sequelas do estresse. No mesmo período de 2010 foram mais de 85 mil casos. Ou seja, houve um aumento de mais de 28%. Estudo da representação brasileira da International Stress Management Association (Isma-BR), uma associação internacional dedicada à prevenção e estudo do estresse, com sede em 12 países, indica que 70% da população economicamente ativa no Brasil está estressada.
O esgotamento físico e mental, conhecido por estresse, é
consequência das condições de trabalho no mercado corporativo
brasileiro. Medo da demissão, pressões dos superiores, alta competição,
busca de lucro e eficácia, falta de valorização, baixos salários e, em
algumas profissões, o risco de morte, deixam trabalhadores apavorados.
Diante desse quadro, o trabalho que deveria ser fonte de prazer e
satisfação, passa a ser local de dor e sofrimento.
O filósofo Bertrand Russel considerava que o ideal da vida não seria
o desintegrar-se completamente pelo trabalho, mas sim, o desfrutar da
liberdade dos momentos de folga. Em oposição ao ditado - o trabalho
enobrece o homem - Russel sentenciava: "Sem a classe ociosa, a humanidade nunca teria saído da barbárie".
Outros pensadores defenderam o ócio ou a redução da jornada de
trabalho, como essencial para gerar grandes ideias e ser feliz. Mas
para sobreviver, a humanidade precisa trabalhar cada vez mais e melhor.
Sob a espada da produtividade, os trabalhadores sofrem de doenças
decorrentes de estresse.
É o caso do bancário M. Após sofrer cinco assaltos no trabalho em 20
anos de carreira, ele adoeceu e ficou de licença por três anos. "O
quinto assalto foi muito violento, na hora da fuga houve um tumulto e o
ladrão disparou várias vezes em minha direção, escapei por sorte e
entrei em choque."
M. foi diagnosticado como portador de transtorno pós-traumático
gravíssimo. No período de afastamento tentou o suicídio algumas vezes. "Eu
não suportava mais ficar em casa, é muito doloroso se sentir inútil.
Durante as perícias médicas, me sentia humilhado, já que o médico
deixava subentendido que eu não voltava ao trabalho por ser preguiçoso.
Fui muito maltratado."
No retorno teve de conviver com perseguição e 'brincadeiras' nas quais era chamado de louco, porque tomava remédios de tarja preta. "Agora,
estou numa equipe mais equilibrada e as pessoas me respeitam. Mas tenho
colegas com muitos anos de casa que estão pedindo demissão por não
suportarem mais as cobranças de metas cada vez maiores."
Além do prejuízo à saúde e às empresas, o estresse e o consequente
adoecimento do empregado representam um gasto adicional à Previdência,
que até junho deste ano desembolsou R$ 147 milhões em auxílio-doença
para portadores desse tipo de distúrbio.
Para a doutora em psicologia Ana Maria Rossi, presidente da Isma-BR, as empresas não dão a devida atenção ao assunto. "Elas
estão conscientes do problema e sentem o impacto negativo que os
afastamentos acarretam, mesmo assim apenas 5% das empresas promovem
ações adequadas para gerenciar as emoções de seus funcionários."
Empresas que oferecem medidas paliativas como ginástica laboral, estão aplicando prevenção secundária, segundo Ana Maria. "Mais importante seria focar na prevenção primária", afirma.
Carga horária
Para a presidente da ISMA-BR as empresas precisam respeitar o horário de trabalho dos empregados.
"Pessoas que ocupam cargo de gerência costumam trabalhar, em
média, 13 horas diárias. Muitos se sentem intimidados em sair do
trabalho no horário correto. Com jornadas cada vez mais extensas o
profissional se sente culpado por não conviver com seus familiares, ou
por não realizar outras atividades. É preciso desmistificar a ideia de
que é positivo ter profissionais 'multitarefeiros', porque isso causa desgaste e aumenta a margem de erros", diz.
Operador de telemarketing, um dos cargos mais estressantes no mercado de trabalho, Jamil de Carvalho não aguentou o baque. "Já
trabalhei em várias empresas de telemarketing, mas nunca vivi uma
pressão tão grande como nesta, da qual estou me demitindo. Eles gritam
e xingam os operadores, nos obrigam a assumir erros da empresa e
aplicam inúmeras advertências para gerar demissão por justa causa", desabafa o trabalhador.
Sobre a inabilidade dos superiores com seus subordinados, o diretor
do departamento de políticas de saúde e segurança ocupacional do
Ministério da Previdência, Remígio Todeschini, afirma ser preciso
retirar fatores negativos do ambiente de trabalho: "Chefes
autoritários e cobradores, também chamados de chefes 'tóxicos', minam a
autoestima dos empregados. É preciso promover programas de qualidade de
vida e de valorização dos profissionais, dando chances de ascensão". E acrescenta: "Antes, a doença ocorria por problemas físicos. Hoje, vemos o crescimento de doenças mentais e comportamentais."
Fonte: Estadão
Psicologado
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