Sergio Henrique Martins
Redator e revisor do Portal da Educação Pública
Caro leitor, por favor, leia com atenção o que vem a seguir.
"Pelo banimento do monóxido de dihidrogênio!
Trata-se de uma substância que mata milhares de pessoas todos os anos. Na maioria dos casos, as vítimas inalaram-na acidentalmente. Só que os efeitos nocivos, infelizmente, não se limitam a isto. A ingestão da substância pode causar náuseas e vômitos e a exposição prolongada à sua forma sólida pode danificar severamente, às vezes de modo irreversível, tecidos vivos.
O monóxido de dihidrogênio é o principal componente da chuva ácida, contribui para o Efeito Estufa e a erosão em áreas naturais, acelera a ferrugem de muitos metais e pode causar defeitos em aparelhos elétricos. Tem causado danos a propriedades estimados em milhões de dólares.
A substância está presente em todo o planeta - inclusive em áreas remotas como a Antártica -, no mar, em lagos e reservatórios! É amplamente utilizada em atividades humanas, como solvente industrial, na refrigeração, no combate a incêndios e até na produção de alimentos. Está presente, também, nos sistemas de usinas nucleares. Nas cidades e no campo, após ser usada, é lançada no ambiente, na maioria das vezes sem qualquer cuidado prévio!
Os governos não cogitam proibir a produção, a distribuição nem o uso do monóxido de dihidrogênio. Consideram-no importante para a economia. Os militares têm feito experiências com a substância, gastando milhões no desenvolvimento de meios para utilizá-la em situações de guerra. As instalações militares recebem-na através de uma sofisticada rede subterrânea de distribuição, e fazem estoques dela".
E agora? Se houvesse um manifesto pela proibição do uso do monóxido de dihidrogênio, você o assinaria? Nos Estados Unidos, várias pessoas assinaram uma petição com essa finalidade. E pela Internet várias mensagens circularam alertando para os riscos da substância e conclamando a sociedade a se unir para bani-la. O texto entre aspas é uma livre tradução de uma dessas mensagens.
Se o leitor já não percebeu faz tempo, o problema é que o monóxido de dihidrogênio nada mais é do que a água. O nome químico dá a dica: monóxido indica a presença de um átomo de óxigênio, e dihidrogênio, de dois átomos de hidrogênio. H2O, portanto.
Por razões óbvias, o texto entre aspas soa ridículo. Por outro lado, pode nos fazer pensar, pois não deixa de ser uma peça de comunicação convincente para os distraídos ou desinformados.
Nenhuma das afirmações do texto é incorreta. Inalar água pode ser fatal, como provam os afogamentos que, de fato, a cada ano, vitimam milhares de pessoas. Se estiver contaminada, sua ingestão pode muito bem levar à náusea e ao vômito. E o contato prolongado do tecido com o gelo produz queimaduras e pode causar necrose. Daí por diante, se desejar, o leitor pode conferir por si mesmo a veracidade do texto.
Que, justamente por combinar verdades no sentido de uma conclusão absurda, pode muito bem ser usado por educadores. Um professor pode entregar cópias do "alerta" aos estudantes e, sem lhes dizer que se trata de um trote, solicitar que após lê-lo atentamente eles debatam sua proposta. É um teste de atenção, conhecimento e pensamento crítico. Depois de revelado o teor nonsense da mensagem - e a descoberta provavelmente vai causar surpresa, despertar curiosidade e, assim, aumentar o envolvimento do grupo da atividade -, o educador pode estimular os alunos a comentarem a estratégia de convencimento usada no texto e a debaterem como um discurso pode usar os fatos para reforçar ou enfraquecer pontos de vista, mesmo os mais aberrantes.
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